MANAUS – A presidente do TRE (Tribunal Regional Eleitoral do Amazonas), Socorro Guedes, negou, na tarde desta segunda-feira, 28, o pedido do ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga (PMDB) de afastamento do governador José Melo e do vice-governador Henrique Oliveira (SD) dos cargos, em função da decisão do tribunal que cassou o mandato dos dois, no dia 25 de janeiro. A presidente disse que seguiu a jurisprudência do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) de manter o governador no cargo até o julgamento dos recursos e o processo tramitar em última instância.
A presidente do TRE disse que a decisão de afastar Melo do cargo poderia causar maior instabilidade política e econômica e mergulhar “a administração pública e, consequentemente, a sociedade, ainda que temporariamente, em momentos de incerteza e insegurança”.
Cassação
O governador José Melo e o vice-governador Henrique Olvieira tiveram os mandatos cassados por compra de votos e abuso do poder político e econômico, condutas vedadas pela legislação eleitoral. O fato que gerou a cassação foi uma operação da Polícia Federal, realizada às vésperas do segundo turno das eleições de 2014, quando foram presas duas mulheres e apreendido material de campanha, recibos e documentos que compraram a compra de votos, segundo inquérito policial. Uma das mulheres presas era Nair Blair, diretora de uma organização não governamental que ganhou contrato, sem licitação, do governo do Estado, em 2014, para prestar serviços durante os jogos da Copa do Mundo em Manaus. O inquérito concluiu que o dinheiro do contrato de R$ 1 milhão fora usado para pagar despesas de campanha do governador e pagar favores a eleitores.
Na ocasião da prisão e da apreensão de documentos, de acordo com a Polícia Federal, havia um grupo de pastores evangélicos no comitê de campanha do governador José Melo, recebendo orientação de como convencer os fieis a votar em José Melo, mediante o pagamento de favores.
No fim do ano passado, uma reportagem do programa Fantástico, da Rede Globo, mostrou os recibos apreendidos e conversou com pessoas que receberam o dinheiro, entre elas uma mulher que teria sido beneficiada com a reforma de um túmulo em um cemitério de Manaus. A reportagem também foi usada no processo como instrumento de convencimento no parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE) e no voto do relator, o jurista Francisco Marques.
Argumentos da defesa
Os advogados de Melo apontam fragilidades nas provas, a começar pelas operações da Polícia Federal, que consideraram ilegais por falta de autorização judicial e baseadas em denúncia anônima. Além disso, numa das operações, alega a defesa, havia no local entre 50 e 70 pessoas e nenhuma foi ouvida como testemunha no processo. A defesa levanta suspeita que diante de tantas pessoas não haja nos autos uma ao menos que confirme a compra de votos.
“A artificialidade da operação policial é patente! (…) Foram ouvidos apenas os policiais federais que participaram da operação. Apesar de, segundo eles próprios policiais, estarem presentes de 50 a 70 pessoas no local, nenhuma delas foi sequer identificada, embora todas tenham sido revistadas e tido seus veículos também devassados pela Polícia. Todos os requerimentos de produção de provas formulados pela defesa foram indeferidos, resultando na interposição de agravo regimental, cujas razões foram apreciadas no julgamento de mérito da representação”, alega a defesa em trecho do recurso.
Outra fragilidade apontada pela defesa em relação ao trabalho feito pela Polícia Federal é em relação a custódia das provas por parte do órgão. Os advogados indicam que não houve cuidado em arquivá-los. Indica ainda que a falta de zelo na identificação e separação dos documentos apreendidos no dia da operação e considerados como provas no processo coloca os mesmos sob suspeita. Melo insinua que, desta maneira, não se pode ter certeza de quando e se entraram e saíram do acervo sem controle.
“ (…) o auto de apreensão foi instruído sem qualquer separação dos documentos. Não se especifica o que estaria com as presas em flagrante; o que estaria em suas bolsas; o que foi apreendido na sala em que ocorreu o evento, ou na sala reservada; onde e com quem foi apreendida essa suposta lista; o que estaria no carro que sofreu busca. Isso já seria suficiente a demonstrar que não foi respeitada a cadeia de custódia. Documentos podem ter desaparecido, enquanto outros podem ter surgido sem explicação”, indica a defesa em outro trecho.
Os advogados afirmam que a decisão dos membros do TRE-AM afrontam o Código do Processo Civil ao “indeferir todas as provas requeridas pelo Representado (José Melo)” e ainda impor o ônus de provar que não praticou as ilegalidades. “O acórdão violou os princípios da boa-fé objetiva processual e o dever de lealdade para com as partes”, alega a defesa.
Fantástico
Outra fragilidade da decisão, para o governador José Melo, é o uso de reportagem do programa Fantástico no processo como instrumento de convencimento no parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE) e dos membros da Corte. A reportagem não constava nos autos e a defesa sequer teve chance de citá-la em seus argumentos, informou Yuri Dantas.
“Em outras palavras, a identificação dos eleitores, a entrega de benesses e o especial fim de agir, elementos caracterizadores da captação ilícita de votos e que exigem prova consistente, teriam sido, na visão equivocada do regional, apontada por meio de reportagem jornalística! E por ligação telefônica, não presencial, em que qualquer um pode se passar até pelo Rei da Espanha, ou por Rainha da Suécia”, cita outro trecho do recurso.
Rascunhos
Melo contesta a veracidade dos recibos apresentados com a assinatura do irmão dele, Evandro Melo, como provas pela falta de perícia. Indica que todos foram preenchidos visivelmente pela mesma pessoa e levanta suspeita na prova questionado se, caso houvesse compra de votos, como Evandro produziria prova contra ele mesmo. Alega ainda que a maior parte dos documentos tem letras incompreensíveis. “Por fim, também está no caderno processual um emaranhado de manuscritos, em sua maioria ilegíveis, seja em virtude da má grafia, seja em razão da reprodução fotográfica que acompanhou a inicial”.
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